I think I'm going to eat dessert cs479

 

 

 

 

 

 

 

 

Ora aqui está mais um exemplo de como, no campo da improvisação e do jazz, as diferentes abordagens vão convergindo num mesmo caudal, avolumando este sem outras diversificações que não as naturais numa música que se pretende efectivamente livre. Miguel Ângelo, figura destacada da Porta-Jazz, líder do Miguel Ângelo Quarteto (o mesmo do celebrado “A Vida de X”) e membro de formações como Ensemble Super Moderne, Pedro Neves Trio e MAP, acaba de lançar um álbum de contrabaixo a solo na Creative Sources, etiqueta conhecida pelas suas edições de carácter exploratório. Este “I Think I’m Going to Eat Dessert”, metaforicamente se referindo àquele momento, após uma refeição, em que pensamos se devemos ou não comer sobremesa. Ângelo optou por o fazer, apenas motivado pela vontade de assim obter «sensações adicionais de sabor».

Em boa hora o decidiu, pois está aqui um dos grandes discos de 2017, um ano que muito profícuo tem sido no que à produção nacional de qualidade diz respeito. Todas as 11 faixas são preenchidas por improvisações integrais, regra geral curtas e com um carácter introspectivo e investigatório que plenamente justifica o facto de três das “peças” se intitularem, simplesmente, “Meditation”, com um algarismo cardinal a distingui-las. Um disco a solo corre o risco da monotonia e da repetição, mas este mantém-nos o interesse do início ao fim, sempre com ideias novas e situações de que não estávamos à espera. E se as ditas “Meditations” funcionam como se um microscópio fosse aplicado sobre o contrabaixo, parecendo aproximar-nos dele fisicamente, a conclusão faz-se com a colocação diante de nós de um fresco que exige à nossa observação alguma distância: “Children’s Playground” junta várias camadas, em sobregravação, processo que torna o improvisado numa composição. E tem outra mensagem: a de que fazer música com este gosto, com este evidente divertimento, é como voltar a ser criança e brincar. Rui Eduardo Paes (Jazz.pt)

Deliciosa improvisação.

Contrabaixista ligado à cena Porta-Jazz, Miguel Ângelo tem participado em alguns dos projectos mais interessantes do jazz nortenho contemporâneo, como o Ensemble Super Moderne, o quarteto MAP ou o Pedro Neves Trio (um dos melhores grupos do jazz nacional, que tem passado despercebido a quase toda a gente). Na qualidade de líder, Miguel Ângelo editou em 2013 o seu disco de estreia, Branco, e já em 2016 editou A Vida de X, momento de confirmação – ambos os discos gravados ao leme de um quarteto que inclui o saxofonista João Guimarães.

Agora, o contrabaixista aventura-se agora num projecto de contrabaixo solo. Se o formato solo já é arriscado para qualquer músico, mais ainda será para um instrumento com as características do contrabaixo, habitualmente remetido (e limitado) ao papel de acompanhamento rítmico. Não são muitos os casos de aventuras de contrabaixo a solo, e muito menos no panorama nacional. Recordamos os casos - já históricos - de Solo Pictórico de Carlos Barretto e de Single de Carlos Bica (edição da saudosa Bor Land).

Contudo, diferente das referências anteriores que tinham composições como base, este disco assenta na improvisação e na exploração. Miguel Ângelo explora os sons contrabaixo e alguns efeitos. A partir daí desenvolve temas, que vão ganhando forma, alguns mais arredondados e acessíveis, outros mais experimentais. Contudo, a música nunca soa demasiado abstracta, sente-se um permanente e apurado sentido de melodia - ouçam-se as memoráveis “Just go!” ou “Lullaby” e confira-se a capacidade daquelas cordas graves de transmitirem sentimentos.

Nas “liner notes” do disco o contrabaixista justifica o título: “I think I´m going to eat dessert refere-se ao momento após uma refeição, em que temos que decidir se comer aquele prato adicional que, embora seja dispensável em termos nutritivos, se justifica apenas pelo prazer de satisfazer a nossa necessidade de açúcar ou de sensações degustativas adicionais.” Ou seja, não havendo necessidade imperativa, trata-se de uma opção de mera gulodice. Em boa hora se decidiu pela sobremesa, porque este disco é composto por uma música rica, ampla, deliciosa. Nuno Catarino (Bodyspace)

We can all agree that music is perceived and enjoyed through the sensory faculty known as hearing. Certainly, but a musical performance is enhanced when an additional sense is summoned, like the visual when attending a production. In the case of this solo performance by bassist Miguel Ângelo, that additional sense is touch. With I Think I'm Going To Eat Dessert, sound is just one element that is shared equally with the sensation of touch.

Ângelo can be heard in the octet Ensemble Super Moderne, Bruno Macedo Quartet, Pedro Neves Trio, the quartet MAP, and leading his own quartet, which released A Vida de X(Porto Jazz, 2015) and Branco (Porto Jazz, 2013). I'd wager a guess that the title I Think I'm Going To Eat Dessert refers to a listener's anticipation of Ângelo's solo during an ensemble performance, calling it dessert. Whereas, by presenting a solo recording we get dessert, not at the end of the meal, but as the main course. 

The tactile experience of this recording includes the resonant sounds Ângelo's double bass generates in the listener's chest. There is a synergy between the bassist's fingers and the sympathetic response it evokes. The disc opens with "I Have A Dream," a brooding composition in which Ângelo leaves sufficient space between notes, always returning to his theme. He has the ability to apply heavy bottom notes on "Never And Never Again" and surf the upper register, as in "Meditation #1," with equal discipline. With any double bass performance pulse is paramount. Ângelo never neglects tempo, like the thudding "Aliens Exists!" or the classically inspired "Farewell Song." He applies some well crafted multi-tracking with "Politics Talk" and "Children's Playground," the latter piece a persistent sculpture of sound that, like all the tracks, makes a connection through the proximity of contact. Mark Corroto (All About Jazz)

No final do mês de Outubro fui agraciado com uma boa noticia, o Miguel Ângelo estava prestes a lançar um novo disco. Mas surpresa das surpresas: a solo. Só contrabaixo. Isolando-se assim de outros instrumentos e músicos com que somos habitualmente brindados quando está a apresentar-se ao vivo. E em boa hora o fez. Por vezes esse isolamento leva a fruição artística muito grande e resulta em alguma coisa maravilhosa.
I Think I’m Going To Eat Dessert”, vem de uma série de duvidas primeiro as lineares da escolha após o prato principal de uma refeição se vamos aproveitar e comer a dita sobremesa. E transpondo para a carreira do Miguel se depois de um Branco (Carimbo Porta-Jazz, 2013) e A Vida de X (Carimbo Porta-Jazz, 2016), tem espaço para este disco a solo, agora lançado.



O disco é composto por onze temas, desde o “I Have a dream” até ao “Children’s playground”, onde a jornada se faz quase toda ela sem grandes arranjos ou deambulações, num som conciso e concreto, com uma maturidade simples, colocando o ouvinte numa franja subtilmente entre a sobremesa e a especiaria gourmet, uma dose certa de açúcar que nos brinda com a tonificação apropriada, conseguida após dois álbuns em quarteto.
 Conseguir arriscar já não é para todos, transpor e materializar só alguns tem essa ousadia. E ainda bem que o jazz português pode contar com um instrumentista com esta técnica, sem desleixar uma doçura natural que transpõe a cada acorde do disco. Após os quarenta minutos depois do primeiro Play no leitor, somos quase obrigados a repetir. No fundo quem dispensa mesmo a sobremesa, quando ela é assim tão bem conseguida.
 Este disco foi lançado no passado dia 5 de Novembro no Solilóquios no Porto. Foi gravado na Casa do Miguel e masterizado pelo Nelson Carvalho e editado pela Creative Sources Records. Miguel Estima (A Certeza da Música)

No es la primera vez que traemos discos a La Habitación del Jazz en los que ha participado Miguel Ângelo bien como líder de grupo o formando parte de grupos como MAP, Ensemble Super Moderne, Pedro Neves o  Bruno Macedo. Todos ellos en el emprendedor sello Porta Jazz, de Porto (Portugal).  

En esta ocasión, Miguel Ângelo nos visita con su último trabajo en el que se enfrenta a once  temas propios en los que el único instrumento que suena es el contrabajo.

A priori, podríamos pensar que un disco así no es fácil de escuchar. No es la primera vez que escuchamos canciones de solo contrabajo, en las que se nos presenta este instrumento  como si formara parte de la sección rítmica de un grupo y se hubiera eliminado al resto de instrumentos. Es decir, falto de personalidad propia como si se avergonzara de ser el protagonista absoluto de la canción. No es el caso de ese disco. 

Miguel Ângelo eleva al contrabajo a la más alta categoría de solista, sin tapujos, sin el más mínimo recato. Así, los once temas que integran el disco, pasan volando, dejando al oyente con ganas de más. 

El sonido es magnífico, la pulsación es limpia y vigorosa, o suave, según lo requiera el tema.

Su intérprete crea melodías que consiguen penetrar en lo más profundo del oyente, formando un  todo indisoluble en el que el instrumento y su intérprete se fusionan en uno solo.

Disco indispensable para los amantes del contrabajo y para cualquier amante del jazz.


La Habitación del Jazz 

 

In addition to his numerous sideman appearances, Portuguese bassist Miguel Angelo has released a couple quartet albums under his own name: Branco (2013) and A Vida de X (2016), both of which possess a strong tuneful vitality. Although the format is very different, Ângelo's decision to release a solo-bass recording this time around does make sense, as it's characterized by the prominent melodies and emotionally resonant playing found in abundance on those previous albums.

From the first moments of the opening track, "I Have a Dream," Ângelo's patient and deliberate approach establishes itself confidently yet without outsized fanfare. Ângelo's articulation is superb, bringing clarity and precision to each note, allowing the sound of his instrument to emerge fully through his unhurried delivery. Although Ângelo describes the music as "mostly moments of pure improvisation," there is a coherence to each track that enhances the tunefulness of the music. This is especially apparent on the folk-like "Never and Never Again," and the lovely "Just Go!" which despite its short duration (less than a minute and a half) creates a thoroughly memorable melodic figure.

Although this record isn't designed to overwhelm the listener with technical bravado, Ângelo does offer some interesting moments that point to his bass prowess. "Politics Talk" sees him combining arco and pizzicato technique to intriguing effect, suggesting a kind of dialogue between two dissimilar perspectives that never quite connect (fittingly enough, perhaps, for describing politics in this day and age?). And the whimsical "Aliens Exists!" involves a somewhat funky use of the lower register of the instrument, almost sounding as though he's using effects to sustain the otherworldly oddness of the track. The only piece that sounds definitively to have used multi-tracking in the recording process is the closer, "Children's Playground," where three or four overlapping parts are combined to produce the album's most dynamic and assertive music, with a sense of rhythmic propulsion created by counterpoint and repeated plucked figures.

The album's title suggests that this is music intended as an afterthought—as something to be enjoyed only after the "main course" has been consumed. But that's somewhat misleading, as it's a substantial repast all on its own: one that leaves the listener fully satiated. Troy Dostert (All About Jazz)